quarta-feira, 11 de novembro de 2020

“MAL Y PENSE” NA DIAGONALIZAÇÃO DO COMPASSO

  

“MAL Y PENSE” NA DIAGONALIZAÇÃO DO COMPASSO
Jose Mauricio Guimaraes
    À Maçonaria interessam todos os assuntos que envolvam o processo civilizatório, a paz, a ética, os bons costumes e a felicidade do gênero humano. Noutras palavras: nenhum assunto é estranho à livre busca da verdade (mas não me perguntem “o que é a verdade”, pois a essa pergunta nem Jesus quis responder ao prepotente Pilatos – cf. João 18:33-38).
    Diante de nossa herança inglesa, também é permitido, em nossas pesquisas, uma boa dose de humor – o ‘nonsense’, ou seja: uma linguagem, desprovida de significação coerente, repleta de elementos surreais (presentes em Edward Lear, Lewis Carrol e mesmo em James Joyce) com situações ilógicas, como se pudéssemos corrigir os costumes mediante o riso (“ridendo castigat mores”).
    Lembro agora aos geômetras e matemáticos que existem teoremas para os quais só se conhece prova por contradição, como o argumento de diagonalização de Georg Cantor, na teoria dos conjuntos, para demonstrar a não-enumerabilidade dos números reais.
    Portanto, vou nessa linha. Antes que os tetos dos palácios desabem sobre nossas cabeças, passo a explicar porque acredito piamente na lisura de todas e quaisquer eleições.
    Diz a lenda que, em 1347, durante um baile na corte de Eduardo III, a Condessa de Salisbury, amante do mesmo Eduardo, deixou cair a liga da meia, perdendo-a no salão (liga, para quem não sabe, é uma tira de tecido elástico, em forma de anel, que aperta a boca da meia, prendendo-a na coxa, a fim de manter as meias bem esticadas). Pois bem, o Rei Eduardo III mais que depressa viu onde a liga da amante caíra; sem a menor cerimônia curvou-se, apanhou-a e, delicadamente, sob o olhar e sorrisos maliciosos dos nobres, recolocou-a, perna acima e coxa, ajustando-a convenientemente no local adequado.
    No dia seguinte toda a Inglaterra comentava à boca pequena (e à boca grande) o acontecido: um escândalo na ilha!
    O Rei, que sendo inglês é senhor da moral, e dos bons princípios e costumes ilibados, criou imediatamente a Ordem da Jarreteira (jarreteira é o outro nome de liga) e adotou como símbolo uma liga azul sobre fundo dourado. A Ordem da Jarreteira tornou-se a mais prestigiosa e dizem que ainda hoje exerce grande influência. Criaram rituais e convencionaram almoços e jantares de gala nas célebres tavernas “O Pato de Chapéu” e “A Melancia Assada”.
    No augusto ato de lançamento da Ordem da Jarreteira, o Rei urrou em francês (que era a língua oficial da corte inglesa)
    "Messieurs, honni soit qui mal y pense! Ceux qui rient en ce moment seront un jour très honorés d'en porter une semblable, car ce ruban sera mis en tel honneur que les railleurs eux-mêmes le rechercheront avec empressement." (‘Senhores! maldito seja quem pensar algum mal sobre isto! Os que riem nesta hora ficarão um dia honradíssimos por usar uma liga igual na lapela, porque a jarreteira será posta em tal destaque que mesmo os trocistas a procurarão com avidez’).
    “Honi soit qui mal y pense” foi o dístico adotado e tornou-se na expressão que significa: “envergonhe-se quem nisto vê malícia” – muito usada em meios cultos e incultos; também pode ser traduzida por “o mal está em quem pensa sobre o mal”.
    Um vetusto analista dos costumes ressaltou que: “os homens só se conhecem e se tornam amigos, solidários e fraternos quando se reúnem em torno de uma mesa de bar para conversar, comer e beber; portanto, para nos tornarmos amigos e fraternos, é indispensável que nos encontremos pessoalmente por aí, nalguma aprazível taverna, portando na lapela a insígnia da jarreteira”.
    Por isso – e na esperança de receber um dia a jarreteira, acredito piamente na lisura de todas e quaisquer eleições.
    Vocês poderão perguntar: "mas o que tem a ver um liga de segurar meias nas coxas com eleições?" – Esclareço que não tem absolutamente NADA a ver, pois as ligas devem permanecer, como no Século XVIII, bem escondidas debaixo das saias das ilustres Damas durante o baile da corte.
    Por isso mesmo creio e aqui prevaleça o mesmo nonsense apregoado por Tertulliano no ano 200 da nossa era: “Credo quia absurdum”.
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OBRAS DE REFERÊNCIA:
Edward Lear - "Nonsense Songs and Stories" (1870);
Georg Cantor - "Grundlagen einer allgemeinen Mannigfaltigkeitslehre" (1883);
Gil Vicente - "Auto da Feira" (1527);
James Joyce - Ulisses (1921) e Finnegans Wake (1923-1929);
Jean de Santeuil - "Obras Imaginárias";
Lewis Carroll - "Alice's Adventures in Wonderland" (1865);
Pangloss - 'Opus Magna' ("Candide, ou l'Optimisme", 1759);
Tertuliano - Escritos apologéticos.

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Airton Carvalho e Gustavão Velasquez Santos
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